Justiça ambiental: quando a falta de saneamento tem cor

A COP30, que acontece em Belém (PA) entre os dias 10 e 21 de novembro de 2025, tem a justiça ambiental como um dos eixos centrais, com o objetivo de garantir que as respostas à crise climática sejam justas, equitativas e inclusivas, abordando as desigualdades sociais e econômicas que afetam as populações mais vulneráveis. O evento busca fortalecer a participação de grupos marginalizados, como indígenas, mulheres e trabalhadores, nas negociações, e pressionar por metas mais ousadas de redução de emissões. 

Mas o que significa, na prática, justiça ambiental?

Para entender o que ele representa, tente responder às perguntas: “Como é o saneamento no bairro em que você mora? Tem água tratada? Tem coleta e tratamento de esgoto? Como as pessoas que vivem em locais sem redes de água e esgoto tratados fazem para beber água limpa, cozinhar, cuidar da higiene e do bem-estar?”

As perguntas acima acendem um alerta: quem são os brasileiros que vivem com e sem esse serviço básico? Segundo o Censo de 2022 (divulgado em 2024), 49 milhões de pessoas vivem sem coleta de esgoto em suas casas, e cerca de 70% delas se declaram negras (pretas ou pardas) ou indígenas. Isto é, existe uma desigualdade social no mapeamento do acesso ao saneamento e quem mais sofre com a sua ausência são os mais vulneráveis.

É um processo de injustiça estrutural que faz com que populações negras, indígenas e periféricas sejam desproporcionalmente impactadas pela degradação ambiental, pela ausência de políticas públicas e pelos efeitos das mudanças climáticas, sem voz nas decisões que afetam seus territórios e modos de vida.

Nos preparativos para a COP30 foi feita uma série de encontros em várias regiões do mundo reunindo filósofos, cientistas, juristas e a sociedade para debater o clima a partir de uma perspectiva ética, de justiça e de equidade. A iniciativa, chamada Balanço Ético Global, é liderada pelo Brasil, por meio da  ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, e pela ONU, e será apresentada durante o evento no Pará.

Quem está fora do mapa do saneamento

Vários estudos comprovam que o acesso ao saneamento está diretamente ligado ao desenvolvimento da qualidade de vida do cidadão e é por isso ele é considerado um vetor de inclusão social. 

Quando uma família passa a ter acesso à água tratada, uma mãe pode cuidar melhor dos seus filhos, uma jovem pode estudar sem perder aulas por causa das doenças recorrentes, uma trabalhadora pode conquistar sua independência. Mas, no Brasil, a realidade ainda é desigual.

De acordo com o IBGE, os pardos, que representam 45% da população brasileira, são os que menos têm acesso ao esgoto adequado (58%). Os pretos, que são 10,2% da população total, fazem parte dos 10,4% que não têm acesso ao serviço de esgotamento sanitário.

Os indígenas, que representam pouco mais de 0,8% da população brasileira, estão entre os 1,4% dos que não possuem serviço de esgoto. Brancos, por sua vez, que são mais de 43% da população, representam a parcela de 29% que não tem acesso aos serviços de esgoto, o que é quase a metade da proporção dos pardos.

Problema estrutural

A relação direta entre falta de saneamento e desigualdade social é reforçada pela realidade do nosso país: 8 em cada 100 pessoas em situação de pobreza no Brasil moram em habitações sem banheiro (IBGE, 2022). Outro dado que reforça essa tese é do Painel do Saneamento, do Instituto Trata Brasil, que afirma que a renda média mensal da população assistida pelos serviços de água e esgoto é quatro vezes maior do que a renda da população desassistida.  

A situação fica ainda pior quando fazemos um recorte dos grupos vulneráveis, como, por exemplo, as mulheres. No Brasil, elas estão entre os 10% mais pobres e são as que menos têm acesso à água tratada. Um estudo recente, também do Instituto Trata Brasil, registrou que uma em cada 4 mulheres em situação de vulnerabilidade social não tem acesso à água tratada. Dentro desse quadro social, os dados mostram que 41 milhões de brasileiras não têm acesso adequado ao saneamento. 

Perpetuação da pobreza

No Brasil, cerca de 28,8 milhões de crianças e adolescentes de até 17 anos vivem na pobreza e, entre eles, 5,4% sofrem com a privação de água e 38% não têm acesso à rede de esgoto. Esses índices do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) comprovam como a falta de acesso aos serviços gera reflexos no desempenho escolar e na perpetuação da pobreza. A relação direta entre saneamento e desigualdade social é reforçada pela realidade do nosso país: de acordo com o IBGE (2022), 8 em cada 100 pessoas em situação de pobreza no Brasil moram em habitações sem banheiro. 

COP30: esperança de mudança

A COP30, em pleno coração da Amazônia, é a chance do Brasil olhar para dentro, ouvir quem está à margem e construir soluções que incluam quem sempre foi ignorado. Garantir saneamento é garantir dignidade, saúde, permanência escolar, autonomia econômica. É quebrar o ciclo da pobreza e reescrever o futuro. Sem justiça social, não há justiça ambiental.

Texto: Rosiney Bigattão

Fotos: Shutterstock.

Fontes:  ID_BR | Correio Braziliense | Brasil de Fato | Balanço Global